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Alta de 72% nos acidentes suspende 5 cirurgias para cada emergência atendida

Publicado em 13/08/2025 Editoria: Saúde


Na Capital, paciente com risco de paralisia teve operação adiada e recorreu à Justiça para garantir tratamento.
 
A espera para fazer uma cirurgia ortopédica pode levar anos na rede pública de Campo Grande, e um dos responsáveis é o alto índice de acidentes de trânsito.
 
Coordenadora do Sistema de Regulação Municipal desde 2017, a médica Larissa Missirian confirma que cada vez mais o atendimento aos casos de emergência com acidentados, principalmente os motociclistas, tem pressionado a ocupação de leitos nos dois hospitais habilitados a fazer cirurgias eletivas ortopédicas classificadas como complexas.
 
"Isso é real e não é só referente a Campo Grande", diz a coordenadora. Dados do Into (Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia) obtidos pela Agência Brasil mostram que 1.450 cirurgias eletivas de alta complexidade deixaram de ser realizadas no ano passado para dar preferência às transferências de emergência no País.
 
Ainda segundo o levantamento nacional, quando uma operação de emergência chega, cinco agendadas deixam de ser feitas conforme o programado.
 
 
A realidade se torna ainda mais grave em Campo Grande, segundo Larissa Missirian, porque há apenas um hospital especializado em politraumatismo para atender pacientes do SUS (Sistema Único de Saúde). Essa é uma condição grave, caracterizada por várias fraturas pelo corpo e até lesões nos órgãos internos, que podem levar à morte.
 
O hospital é a Santa Casa de Campo Grande. "É a única referência que temos. Para completar, há poucas opções de hospitais que atendem à ortopedia, e Campo Grande recebe pacientes de todas as regiões de Mato Grosso do Sul", avalia.
 
Além da instituição, o Humap (Hospital Universitário Maria Aparecida Pedrossian) recebe casos classificados como de ortopedia complexa. Porém, além de não atender os politraumatizados, tem uma quantidade limitada de centros cirúrgicos e profissionais.
 
O Hospital Adventista do Pênfigo não está apto para receber pacientes com problemas ortopédicos complexos, mas esse pedido tramita no Ministério da Saúde. Poderá ser uma opção para desafogar a fila no futuro.
 
Paralisia no braço - As próprias vítimas de acidente de trânsito, quando precisam voltar ao hospital meses depois para fazer uma cirurgia, acabam tendo que "disputar" leitos com os pacientes das emergências e amargar uma longa espera que pode piorar a sua condição de saúde e deixar sequelas graves.
 
Foi o caso de um jovem de 25 anos que sofreu um acidente de moto em 30 de dezembro do ano passado, na Capital. Ele foi diagnosticado com paralisia no braço esquerdo e tinha indicação médica para fazer cirurgia de reconstrução no SUS em até seis meses após a lesão. Caso não fizesse a tempo, corria o risco de perder os movimentos.
 
O homem chegou a ter uma consulta na especialidade de neurologia geral agendada na Santa Casa em 1º de julho deste ano, quando o prazo médico já havia terminado. Pouco antes, recebeu uma mensagem do hospital informando que houve “suspensão temporária para transição de equipe”, sem qualquer previsão de nova data.
 
Com medo de ficar incapacitado de trabalhar e realizar atividades simples no dia a dia, o paciente decidiu contratar um advogado para exigir prioridade no atendimento.
 
A Procuradoria-Geral da Prefeitura de Campo Grande foi cobrada a se manifestar no processo, mas acabou anexando uma peça judicial que não tinha a ver com o caso. Justificou que era um "lapso" e pediu a retirada dos autos, mas não enviou nenhum novo documento depois, mesmo sendo notificada.
 
 
Entendendo a gravidade do caso, juiz atendeu o pedido para que a cirurgia fosse realizada na rede particular e deu ordem que R$ 264,5 mil fossem sequestrados dos cofres da prefeitura para pagar a operação e todos os procedimentos pós-operatórios e de reabilitação. O valor foi depositado em conta judicial em 1º de agosto e pode ser usado pelo paciente.
 
Por gravidade - Larissa explica que o SUS (Sistema Único de Saúde) obedece ao princípio da equidade: ou seja, o atendimento é feito conforme a necessidade dos pacientes. Os casos mais urgentes são atendidos primeiro.
 
Quando entram as emergências e as salas cirúrgicas estão ocupadas, acaba-se por cancelar ou nem conseguir agendar as cirurgias eletivas. Às vezes, pode chegar um paciente que não sofreu trauma e não foi vítima do trânsito, mas é uma emergência cirúrgica porque pode estar com abdômen agudo obstrutivo, por exemplo. Ele acaba passando na frente de um paciente eletivo e, então, temos que adiar, remarcar para outro dia ou reagendar a cirurgia
 
 
A Sesau (Secretaria Municipal de Saúde) foi questionada sobre a quantidade de leitos reservados para pacientes com problemas ortopédicos e sobre os recursos destinados para a especialidade, mas informou via assessoria de imprensa que não possui esses números. Quanto ao número geral de vagas hospitalares na rede pública, informou que são 1.719 leitos "contratualizados pelo SUS, incluindo leitos de UTI (Unidade Terapia Intensiva) neonatal, pediátrica, adulto, leitos de enfermaria e outros".
 
Outros fatores - Além dos acidentes de trânsito e do número insuficiente de hospitais que disponibilizam atendimento na ortopedia complexa, Larissa cita como fatores que forçam a espera por cirurgias eletivas o envelhecimento da população, as complicações de doenças crônicas que demandam internação e a necessidade de mais leitos na Capital. "A ortopedia sempre foi o nosso gargalo", finalizou a coordenadora.
 
No mês passado, o Ministério Público Estadual abriu inquérito civil para investigar falhas graves na estrutura do atendimento de ortopedia na rede pública que acabam gerando despesas caríssimas para os pacientes tratarem os problemas na rede particular, ao conseguirem o bloqueio de verba pública. Em paralelo, outra investigação é feita para apurar a omissão do poder público na hora de contestar o bloqueio de valores para operações em hospitais privados.
 
Questionada pela reportagem na data de abertura do inquérito sobre as possíveis falhas a Sesau não se manifestou sobre elas. No entanto, a assessoria de imprensa esclareceu o ponto abordado pelo Ministério Público sobre banco de ossos para serem usados nas cirurgias ortopédicas.
 
A pasta confirmou outra carência na rede pública relacionada à especialidade ao informar que Campo Grande só possui banco de ossos na Unimed, da rede particular. "A instalação desse tipo de serviço não é simples e depende do interesse de alguma entidade em ofertá-lo na rede pública. Caso haja essa intenção, as tratativas ocorrem diretamente com o Ministério da Saúde. No Brasil, ainda são poucos os locais que dispõem dessa estrutura, considerando a complexidade técnica e os altos requisitos exigidos para o funcionamento", disse em nota.


› FONTE: Campo Grande News